Tese multichain enfraquecida com a dominância do Ethereum? O que é "zero conhecimento" (ZK)?
Lançamento da zkSync, Polygon zkEVM, Consensys zkEVM e mais!
Uma semana após o lançamento da Arbitrum, um dos maiores projetos de escalabilidade do Ethereum, tivemos o anúncio de que a zkSync também liberou sua segunda camada para a rede em produção.
Perdido nos nomes e nas propostas de cada um dos TRINTA projetos na categoria? Calma, hoje vamos abordar um pouco mais sobre cada um deles.
Em geral, o principal objetivo desses projetos de camada dois é possibilitar que milhares de transações por segundo sejam processadas de uma maneira eficiente no ecossistema do Ethereum.
Mas, vale sempre lembrar, essa “escalabilidade” que tanto falamos deveria ser apenas um meio para um fim, certo? Um sistema financeiro mais acessível e democrático? Transferências de valor que não dependam de entes centralizados? Clusters sociais incensuráveis?
Tudo isso é incrível.
Mas, a verdade é ainda não sabemos exatamente qual a melhor forma de atingir o patamar técnico que possibilite a existências desses casos de uso para bilhões de pessoas; é só ver a quantidade de projetos buscando soluções diferentes (mais de 30 tentativas apenas no Ethereum) para começar a entender o estado atual.
Esses casos de uso, e outros ainda nem imaginados, continuam sendo o objetivo final da maioria do segmento, mas também é natural que atualmente o mercado tenha um foco enorme no “COMO” chegar nesse nível de escala.
zkSync e as tecnologias de zero conhecimento (zero knowledge - ZK)
Apesar da zkSync ainda estar bem tímida no valor total das aplicações dentro de seu ecossistema, com menos de USD60MM no zkSync Era, comparado com USD5 bilhões da Arbitrum e USD2 bilhões da Optimism, é difícil encontrar alguém que não tenha ficado animado com seu lançamento e com os anúncios recentes da Polygon zkEVM, Consensys zkEVM e Scroll zkEVM.
Existem explicações incríveis sobre ZK no mercado, inclusive com aplicações para além de cripto, como os diferentes tipos de ZK escrito pelo próprio Vitalik Buterin e esse vídeo mais didático da Wired explicando a tecnologia em 5 níveis diferentes de sofisticação, da criança na escola até o cientista excêntrico.
No geral, as tecnologias ZK te permitem provar alguma declaração com o menor nível de informação necessário. Deixando a definição mais formal de lado, imagina que você precisa provar sua idade pra consumir uma IPA West Coast no bar. Provavelmente, o garçom vai te pedir algum documento e você vai conseguir provar com seu RG que você tem mais de 18 anos de idade e, por isso, pode consumir livremente esse néctar dos deuses (sem favoritismo).
MAS, nessa troca de informações, você também acabou fornecendo dados que não eram absolutamente necessários pra provar que você é maior de idade, como sua idade exata, filiação parental, número do documento, naturalidade, assinatura, nome completo e até a digital.
Em um mundo com ZK, você conseguiria apenas provar que é maior que 18 anos, sem fornecer mais nenhuma informação que não fosse necessária pra atividade-fim.
Como as soluções de escalabilidade do Ethereum se conectam com esse conceito?
No geral, todas essas soluções pretendem levar parte da carga computacional para fora do “Ethereum raiz” (camada um), processar o resultado esperado na camada dois (off-chain) e publicar uma prova desse resultado de volta no Ethereum, para que as pessoas possam confirmar e, até contestar, o resultado publicado.
Em outras palavras, “All that matters is to guarantee correctness of the off-chain execution, as well as availability of the data behind the execution.”
Atualmente, existem duas grandes abordagens possíveis para esses projetos: o modo otimista (optimistic rollups) e o modelo de zero conhecimento (zk rollups).
No primeiro modelo, os agentes atuam com a premissa “otimista” que os resultados foram publicados da forma correta (não tendo, por exemplo, gastos de fundos que não foram autorizados). Por isso, a maioria das implementações precisam dar um tempo (uma semana, por exemplo) para que os vigilantes do mercado possam contestar aquele resultado publicado. Apenas após esse período de segurança, os fundos retirados da camada dois são liberados no Ethereum. Hoje, os principais projetos são Arbitrum e Optimism.
Já no modelo de zero conhecimento, os resultados são garantidos por “mágicas criptográficas” complexas e permitem o resgate dos fundos da camada dois assim que os resultados são confirmados no Ethereum. Alguns dos principais times trabalhando nessa modalidade são: zkSync, Scroll, Polygon e Consensys.
Se o modelo de zero conhecimento é tão bom assim, por que apenas os modelos otimistas foram lançados em escala e estão ganhando market share?
Mesmo sendo destacado pelo próprio Vitalik que todos os rollups provavelmente serão ZK nos próximos 10 anos, a tecnologia ZK ainda é menos evoluída em relação aos modelos otimistas, especialmente em termos de compatibilidade com o Ethereum.
Nas redes da Arbitrum e OP (ambos modelos otimistas), as mudanças são mínimas para lançar uma aplicação descentralizada que já funciona nativamente no Ethereum. Por exemplo, boa parte do código usado pra criar o Uniswap no Ethereum pode ser replicado pra criar a mesma aplicação no Arbitrum/OP. Ou seja, é possível falar que a aplicação do Ethereum é compatível ou equivalente com a nova camada dois.
Mas, quando falamos dos projetos ZK, essa “equivalência de aplicações” é mais desafiadora, especialmente considerando a forma como algumas das partes do próprio Ethereum foram construídas.
No geral, os projetos que decidem embarcar na missão dos ZK Rollups precisam (i) escolher entre ter mais compatibilidade com o Ethereum (protocolo e aplicações), mesmo que isso signifique sacrificar performance (custo alto e maior tempo para criar provas) ou; (ii) ir pelo caminho inverso e priorizar performance em detrimento da equivalência com o Ethereum, passando por vários tons de cinza no processo:
Segundo o pensamento vitalikiano, os rollups deveriam progressivamente migrar para o tipo 1, mas isso ainda é uma longa jornada. Atualmente, e sem demérito algum, os principais projetos do mercado ainda estão no tipo 3 (Scroll e Polygon) e tipo 4 (zkSync, Starkware).
Nas palavras do Alex Gluchowski, CEO da Matter Labs (responsável pelo desenvolvimento da zkSync), a justificativa é que começar pela compatibilidade antes da performance apenas perpetua os problemas antigos e conhecidos do Ethereum:
“If you go for bytecode compatibility, or if you’re going for full equivalence, you will stick to the old problems,” he added. “If you want to emulate some old gaming computer on a MacBook, you can do it. But you cannot emulate the macOS experience on some older things. You want to go first for maximum performance, then you can support backwards compatibility to an arbitrary degree with some performance penalty.”
O futuro multichain fica ameaçado com o sucesso dos rollups?
Em 2019/2020, com o Ethereum patinando nas suas grandes atualizações de rede e as tentativas infrutíferas de escalabilidade (Plasma, Sidechains, State Channels), foram bem compreensíveis as declarações de outras redes distribuídas alegando, mesmo que indiretamente, que poderiam “matar o Ethereum” ou “tomar o lugar da maior rede de computação distribuída do mundo”.
Em 2022, e me arriscando a ser chamado de maximalista Ethereum, o jogo mudou. Partes estruturais da rede já foram entregues ou estão bem encaminhadas (EIP 1559, The Merge, Shapella, Proto-Danksharding, etc); (ii) as segundas camadas já somam valores (TVL) individualmente maiores até mesmo que redes mais antigas do mercado (alô Polygon, Avalanche, Fantom, Solana, Algorand, Cardano, EOS, Celo, Tezos); (iii) os “Ethereum Killers” continuam se matando com incidentes de estabilidade; (iv) projetos de camada dois do Ethereum continuam facilitando a migração e onboarding de novos programadores usando a familiaridade deles com linguagens de programação tradicionais; (v) e, principalmente, já são possíveis customizações das camadas dois para que se adequem a um caso de uso específico, como na Arbitrum Orbit e no OP Stack.
Apesar de não ser preto no branco, vemos esses fatores contribuindo ainda mais para a tese da escalabilidade vertical (camadas dois, três, quatro e adiante usando Ethereum como camada de liquidação) do que para a antiga narrativa de escalabilidade horizontal (novas camadas base sendo criadas).
Dito tudo isso, vale sempre o disclaimer de um mercado novo e quente: aguardem a próxima edição da Caverna Cripto em que algo estruturalmente relevante acontece em menos de 10 minutos e acaba alterando completamente a opinião acima 😆.
Até semana que vem!